sábado, 24 de março de 2012

Anunciação de Nossa Senhora
Festa, dia 25 de março

Paulo Francisco Martos

Numa pequena casa da cidade de Nazaré, ocorreu o acontecimento mais importante da História da humanidade: a Encarnação da Segunda Pessoa da Santíssima Trindade no seio puríssimo de Maria. A Santa Igreja comemora esse transcendental acontecimento a 25 de março, precisamente nove meses antes do Natal.
O evangelista São Lucas narra o fato com simples palavras.
O valor da graça 
Inclinando-se respeitosamente diante da Santíssima Virgem, o Arcanjo São Gabriel disse-lhe: "Ave, cheia de graça, o Senhor é contigo" (Lc 1, 28).
Consideremos as palavras: Cheia de graça. A menor das graças vale mais que todo o universo material. Pois a graça é a participação da vida divina. Se tivéssemos que escolher entre a menor das graças e todos os tesouros do mundo, deveríamos, sem a menor hesitação, preferir a graça.
Ora, desde o primeiro instante da concepção, que foi imaculada, a graça divina inundara a alma de Maria e essa graça não cessaria de crescer em proporções que desafiam os cálculos de nossas débeis inteligências. Por isso, São Gabriel A chamou: Cheia de graça.
Humildade da Virgem 
Maria Santíssima compreendia perfeitamente a imensidade de Deus e o nada da criatura. Devido à sua prodigiosa humildade, Ela se espantou ao ouvir aqueles louvores.
Vendo a mais perfeita das criaturas ter sentimentos tão despretensiosos, o embaixador celeste acrescentou: "Não temas, Maria, pois encontraste graça diante de Deus; eis que conceberás e darás à luz um Filho, a Quem porás o nome de Jesus. Ele será grande, será o Filho do Altíssimo. Deus lhe dará o trono de seu pai Davi, e reinará eternamente e o seu reino não terá fim" (Lc 1, 30,33).
Espírito profundamente lógico de Nossa Senhora 
Logo após o primeiro elogio feito por São Gabriel, a Santíssima Virgem "meditava que saudação seria esta" (Lc 1, 29).
E quando o anjo anunciou-lhe que Ela seria Mãe de Deus, a Virgem indagou: "Como se fará isso, pois Eu não conheço varão?". E ele respondeu-lhe: "O Espírito Santo descerá sobre ti, e a virtude do Altíssimo te cobrirá. E, por isso mesmo, o Santo que há de nascer de ti será chamado Filho de Deus" (Lc 1, 35-37).
União Hipostática 
Compreendendo ser essa a santíssima vontade de Deus, a Virgem disse ao Anjo: "Eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a vossa palavra" (Lc 1, 38).
poderosa, ó eficaz, ó augustíssima palavra! -- exclama São Tomás de Vilanova (1488-1555). Com um Fiat (faça-se) criou Deus a luz, o céu, a terra, mas com este Fiat de Maria um Deus se tornou homem como nós".
Então operou-se a maior de todas as maravilhas. Pela ação do Espírito Divino começou a formar-se no seio da Virgem puríssima o corpo do Menino Jesus. O mesmo Espírito Santo uniu a esse corpo uma alma humana e juntou corpo e alma à Segunda Pessoa da Santíssima Trindade. Essas três partes de uma mesma operação foram simultâneas, e esse sublime mistério é denominado pela Teologia de União Hipostática. Na Pessoa de Nosso Senhor Jesus Cristo -- verdadeiro Deus e verdadeiro Homem -- se unem as naturezas divina e humana.
Maria, Mãe de Deus
A Virgem é Mãe de Deus porque gerou alguém que é Deus. Não é, porém, Mãe da Divindade ou da natureza divina; é Mãe duma Pessoa Divina enquanto produziu, no tempo, a natureza humana dessa Pessoa.
Ora, Maria é mãe no sentido próprio. Pois o sujeito gerado é Deus ou uma Pessoa Divina, e não uma pessoa humana que depois foi feita Deus. O filho da Virgem é Deus no momento da concepção. No mesmo instante em que foi homem, foi Deus e homem, porque a natureza humana de Jesus estava destinada a subsistir, unida à natureza divina, na Segunda Pessoa divina.
Esses pontos são doutrina de fé, explicitamente definida e de primeira importância no dogma da Encarnação, pois compreende:
1. A declaração da natureza humana de Cristo, sem a qual não haveria a maternidade de Maria.
2. A declaração da natureza divina de Cristo; do contrário, o filho de Maria não poderia chamar-se Deus.
3. A declaração da união hipostática das duas naturezas na mesma pessoa, a divina; só assim pode ser um mesmo, o filho de Deus-Pai e o filho de Maria.
4. A declaração desta união desde o instante da concepção de Cristo; do contrário, a mãe de Cristo-Homem não se poderia chamar e ser Mãe de Deus.
Maria é chamada verdadeiramente Mater Dei, em latim, ou Theotokos, em grego, conforme definiu solenemente o Concílio de Éfeso, no ano de 431.


Fonte: Revista de Cultura Catolicismo, março de 1996.
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Fontes de referência:
- Santo Afonso Maria de Ligório, Glórias de Maria Santíssima, Vozes, 1964.
- Cônego Raymond Thomas de Saint-Laurent, La Vierge Marie, Aubanel Frères - Avignon, 1927.
Frei J. Armindo Carvalho, O.P., Maria no plano de Deus, Cadernos Culturais, 1, Braga, 195

domingo, 11 de março de 2012

Imagens de Nossa Senhora face à moda
Em algumas imagens da Santíssima Virgem, Ela aparece magnificamente trajada; em outras, porém, apresenta-se de forma despretensiosa, dando-nos exemplo de modéstia
                                                                     Valdis Grinsteins
Nossa Senhora de Fátima
Há certas perguntas que nunca me teriam passado pela cabeça, mas uma vez formuladas, não saem do pensamento até serem resolvidas. Uma delas foi a apresentada por uma senhora francesa ao Prof. Plinio Corrêa de Oliveira. Desejava ela saber o motivo pelo qual as vestes de Nossa Senhora de Fátima eram tão simples — uma modesta túnica branca, com bordadura dourada. E, ademais, nessa aparição a Virgem Santíssima apresenta-se sem calçado. Realmente, para uma Rainha, era esta uma vestimenta a mais simples possível. 
Por incrível que pareça, vi inúmeras vezes imagens de Nossa Senhora de Fátima, e nunca havia reparado nesse aspecto. A moda não é, nem de longe, o que mais me atrai. Mas não posso deixar de reconhecer que por detrás dessa pergunta pode-se constituir todo um mundo de interessantíssimas considerações.
Com efeito, a moda não é uma coisa banal. Na escolha de uma roupa está subjacente um pensamento, e ela pode encerrar mais sociologia do que a escolha de uma comida. Podemos aquilatar, por exemplo, se uma pessoa é extravagante pela forma como ela se veste. Isto posto, o que dizer das vestes da Santíssima Virgem?
 Consideração preliminar
Véu de Nossa Senhora na Catedral de Chartes
Antes de mais nada, devemos esclarecer que vamos tratar da forma como aparecem vestidas as imagens de Nossa Senhora, e não como Ela se vestia em sua vida terrena. Até porque são parcas as informações que possuímos sobre as vestes originais da Virgem Maria, das quais um dos componentes é o véu usado por Ela, que se conserva na Catedral de Chartres, na França. Ele foi analisado segundo os métodos mais modernos da ciência, e descobriu-se que foi tecido com as técnicas utilizadas pela classe alta da Palestina do primeiro século, mas os fios correspondem aos usados pelas classes pobres. O que coincide com a vida de Nossa Senhora, que, tendo sangue real, vivia num estado de edificante pobreza.
As diversas imagens de Nossa Senhora correspondem geralmente a duas classes: as que foram pintadas ou esculpidas segundo a imaginação do artista; e as que foram feitas tendo por base uma aparição, e nas quais procurou-se representá-La o mais parecida possível com a visão.
Imagens baseadas em aparições
Nossa Senhora de Lourdes
Entre as imagens que procuram representar a Virgem do modo como Ela apareceu a videntes, as mais conhecidas são as de Fátima e Lourdes. Tanto os três pastorzinhos de Fátima como Santa Bernadette Soubirous deixaram descrições pormenorizadas da forma como Ela estava trajada. Mais ainda, eles supervisionaram a confecção das imagens, ou as comentaram.
Em ambos os casos, o traje de Nossa Senhora é muito simples, constituído por três peças: a cabeça é coberta por um véu longo; um vestido chega até os pés; e em torno da cintura, um elegante cinto. As cores são igualmente singelas: branco e dourado em Fátima; branco e azul em Lourdes. Nos dois casos, Ela apresenta-se sem calçados.
 Por que Nossa Senhora quis aparecer vestida desse modo em Lourdes? Se analisarmos o contexto em que se deu a aparição, veremos que, na metade do século XIX, o mundo entrava numa era de prosperidade material e decadência moral. E para exercer um apostolado em relação a essa época, Ela apelava justamente para o oposto: as vestes longas e brancas, conclamando à castidade um mundo que começava a apreciar a freqüência a praias, a usar decotes exagerados e cada vez menos recatados. Ela, entretanto Rainha, aparece sem jóias a um mundo que media as pessoas não mais pela virtude, mas pela riqueza. E aparece descalça, não por naturalismo, muito menos por hippismo, mas porque andar descalço era um modo de fazer penitência. O Rosário na mão e o fato de estar descalça constituem justamente a conclamação à penitência e à humildade. Resumindo: Nossa Senhora vestia-se de forma contrária à sensualidade e ao orgulho do mundo naquele século XIX.
E em Fátima? Ela aparece igualmente descalça e completamente coberta. Os vícios turbulentos do século XIX tinham se transformado em verdadeiro tufão no século XX. Era mais necessário do que nunca conclamar à prática da castidade e à vida penitencial. Mas — detalhe importante — o traje d’Ela ostenta uma borda dourada. Que significado teria isso? Lembremos que na Mensagem de Fátima a Virgem anuncia, para além de todos os castigos e todas as tragédias, um imenso triunfo — a vitória completa de seu Imaculado Coração. E esse fio de ouro ao longo de todo o vestido e do véu, bem como no cinto, parece ser uma espécie de promessa da vitória final, com a anunciada implantação nesta Terra do Reino de Maria.
Nossa Senhora de Guadalupe
Poderíamos ainda tratar da forma como Nossa Senhora se veste na aparição de Guadalupe, no México. Ela ostenta vários símbolos que os índios astecas conheciam: concomitantemente, o véu das mulheres casadas e o cinto das mulheres virgens.
Poder-se-ia aduzir ainda a imagem de Nossa Senhora de Coromoto, padroeira da Venezuela, uma das poucas aparições em que se mostra coroada, querendo assim indicar que Ela é Rainha e irá reinar.
Imagens de devoção popular
Há um segundo grupo de imagens. São aquelas confeccionadas por artistas para representar esta ou aquela devoção dos povos, este ou aquele mistério da vida de Nossa Senhora. Tais imagens são vestidas com modéstia, embora às vezes de forma muito rica.
Nossa Senhora Imperatriz da China
Exemplo: Nossa Senhora Divina Pastora normalmente é representada como se vestiam as pastoras francesas ou italianas do século XVI ou XVII — devoção especialmente difundida pelos padres capuchinhos. Trajes simples, de origem popular, mas de inegável bom gosto.
Diferente é a representação feita pela imagem de Nossa Senhora Imperatriz da China: vestida com os trajes que correspondem à classe nobre daquela nação. Com seda amarela, ornada de figuras orientais, emoldurada por uma bordadura preta, também com desenhos. Tanto a Santíssima Virgem como o Menino Jesus usam luvas pretas, e Ela ostenta longuíssimo e belo colar de pérolas. Detalhe encantador: a parte inferior do traje procura dar a impressão de pairar sobre nuvens. Para encerrar, não apenas a coroa, mas até o penteado é tradicional na China. Haverá melhor representação da elegância oriental?
A obra-prima da Criação
Não queremos deixar de aduzir um problema final. Nestes dias de permissivismo exacerbado, nos quais procura-se justificar as modas mais indecentes, é comum ouvir a seguinte objeção impudente: “Por que não se pode ostentar o corpo, se ele foi feito por Deus?”
Nossa Senhora del Miracolo
Com este pretexto, deseja-se aprovar todas as imoralidades, todas as comodidades e todas as decadências.
Ora, Nossa Senhora é a obra-prima da Criação, portanto perfeitíssima. Não apenas sua alma é perfeita, mas também seu corpo. Uma vez que Ela foi concebida sem pecado original, mesmo com o passar dos anos a Santíssima Virgem não sofreu qualquer degenerescência — o que ocorre com todo ser humano. Todos os homens, devido ao pecado original, se deformam com a idade, com as doenças, com a falta ou excesso de alimento etc. Se a Virgem Santíssima, que não sofreu qualquer espécie de deterioração, dá-nos o exemplo de modéstia e recato no vestir, não será mais sapiencial seguir seu excelso exemplo?
 (Fonte: Revista de Cultura, Catolicismo - Março de 2005)

 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

As aparições de Lourdes e a
Mediação Universal de Nossa Senhora
Plinio Corrêa de Oliveira ("Santo do Dia", 04 de fevereiro de 1965)


Estamos na Novena de Nossa Senhora de Lourdes, de maneira que poderíamos acrescentar mais uma palavra a respeito dessa devoção.
A gruta das aparições em Lourdes
Acho que dos muitos aspectos que essa devoção tem, um me parece que tem sido insuficientemente acentuado e é o seguinte: os senhores sabem que para o Reinado de Maria, uma verdade fundamental é a Mediação Universal de Nossa Senhora. Porque para Nossa Senhora ser verdadeiramente Rainha, é preciso que Ela possa junto a Deus tudo quanto Ela queira, pois é por esta forma que Ela governa o mundo.
Nossa Senhora, pela Sua própria natureza, - Ela tem uma natureza humana como a nossa - não tem mais poder sobre os astros, sobre os homens, do que nós temos. De maneira que, para ter o reinado de todo o universo, para ser a Rainha de todos os Anjos, a Rainha de todos os Santos, a Rainha de todos os homens, a Rainha de todo o mundo material e dominadora terribilíssima e completa do demônio, Ela precisa ter a graça de Deus. E é exatamente enquanto ponto de convergência de todas as graças de Deus que ela é Rainha. A onipotência de Nossa Senhora tem sido muitas vezes chamada, e muito adequadamente, onipotência suplicante, porque é por meio da súplica que Ela faz, que Ela pode tudo. Porque Ela pode tudo junto dAquele que pode tudo, é por isso que é Rainha. E, portanto, o Reinado de Nossa Senhora é o reinado das súplicas que Ela faz, do valor das orações que Ela oferece.
A vidente de Lourdes, Santa Bernadette Subirous
Portanto, a realeza de Nossa Senhora está numa conexão íntima com o fato de Ela ser o canal de todas as graças. Ela é a Rainha de tudo porque todas as graças passam por Ela. Todas as graças que são dadas aos homens, são dadas pelas mãos dEla. Todos os pedidos que os homens fazem são apresentados por meio dEla. E se todos os santos e anjos do Céu pedissem algo que não fosse por meio dEla não obteriam. Ela sozinha, pedindo sem nenhum deles, obtém. De tal maneira o foco da predileção Divina se concentrou por inteiro nEla. E depois, parte dEla de novo para toda a criação. É porque Ela é medianeira de todas a graças que Ela é onipotente. Há, portanto, uma espécie de correlação íntima entre uma coisa e outra.
Agora, as aparições de Lourdes se inserem numa série de aparições de Nossa Senhora no século XIX, que são as mais célebres dessas aparições e, debaixo de alguns pontos de vista, merecidamente as mais célebres. Essas aparições de Nossa Senhora no século XIX, que culminam com Fátima, culminam com a afirmação do Reinado de Maria. E a aparição de Lourdes, portanto, está num pontilhado de aparições que são como que, nas noites extremas de nossos dias, uma clarinada do Reino de Maria, pontos alvos anunciando que o Reino de Maria virá.
Em Lourdes, em cada uma dessas aparições, seria muito interessante estudar a presença da idéia da Mediação Universal das graças e do Reinado de Maria. Em Lourdes, especialmente, se pode dizer debaixo de um título: Nosso Senhor poderia ter dado essa fecundidade estupenda de milagres a um santuário dEle.
Na França, por exemplo, há um santuário magnífico consagrando uma devoção estupenda a Ele, que é o Santuário de Paray-le-Monial, onde Nosso Senhor fez suas revelações a Santa Margarida Maria Alacoque. Ele poderia perfeitamente fazer com que esses milagres se dessem lá, se dessem em todos os santuários consagrados a Ele. Mas Ele quis que a maior fonte de milagres que houve na História da Igreja, na História do mundo, fosse num santuário consagrado a Nossa Senhora. Quer dizer que Ele quis que aquelas curas todas só fossem obtidas sob a égide de Nossa Senhora, depois de uma aparição de Nossa Senhora, como uma graça de Nossa Senhora, e mediante um pedido feito a Nossa Senhora. Ou seja, Ele quis que todas essas curas estupendas passassem pelas mãos dEla.
Quis que passassem para que? Evidentemente para documentar o dogma, que ainda não é dogma, é verdade de fé, da Mediação Universal, para os homens compreenderem bem até que ponto Ela pode tudo. As piores doenças, os maiores males, os sofrimentos mais horrorosos Ela cura, toma as leis mais inflexíveis da natureza e as elimina. Ela vence tudo: uma pessoa que vê sem nervo ótico... Isso é um tal domínio de Nossa Senhora sobre a natureza, como mais não se pode imaginar! Bem, isto tudo é feito por meio dEla. Por que? Para mostrar que todas as graças vêm por meio dEla. E a presença de todas as graças nas mãos dEla para serem distribuídas, por sua vez, quer dizer que Ela é a Rainha do Céu e da Terra. E por Ela passa tudo.
Eu me lembro de uma cançãozinha religiosa, que se cantava no meu tempo, em que havia um resto de piedade, e que dizia: “Salve, ó Mãe! Salve, ó Virgem Santíssima! Do universo portento e primor; mais esplêndida glória que a Tua, só tem Deus, do universo Senhor.” É piedosa a canção e realmente a conclusão é esta: mais esplêndida glória que a Tua só tem Deus, do universo Senhor.
Quer dizer, Nossa Senhora está infinitamente abaixo de Deus. E tudo quanto está abaixo de Nossa Senhora está incomensuravelmente abaixo dEla. É o que a perenidade das curas de Lourdes nos diz.
Há uma certa religiosidade um pouco dada a graças materiais, a pedir favores materiais, etc., etc., que desdenha os favores espirituais e que se impressiona muito com as graças [materiais] de Lourdes. Há quem não compreenda que os favores materiais que Deus dá são de fato favores. E favores que a gente deve pedir. Mas que só são verdadeiramente favores, na medida em que levam a nossa alma a desejar os favores espirituais, as graças para a alma. É por aí que verdadeiramente Deus atrai as almas para Ele, porque todos os favores tem este [fim].
Não se pense que a cura de Lourdes é só porque Nossa Senhora tem pena do homem que é capenga, no sentido físico da palavra, e que Ela corrige o coxo. Ela tem pena do coxo, é claro. Ela tem gosto em corrigir a capenguiçe do coxo, é claro. Mas muito mais do que isto Ela quer fazer a ele um bem à sua alma. E serve-se de um milagre físico, para fazer bem à alma dele e dos outros que vêem isto. E o bem que no caso está em vista é uma grande fé na verdade de que Ela é medianeira de todas as graças.
Eu digo isto porque nós tivemos, não me lembro bem se ontem ou anteontem, a cerimônia das velas de São Braz. Eu estava vendo aquele mundo de gente que vai lá para se proteger contra a dor de garganta. É claro que Nossa Senhora ama, preza, de nos livrar de um mal da garganta, nos casos em que esse mal não nos conduza para a salvação. Porque às vezes uma dor da garganta, e coisas piores do que isto, às vezes muita doença faz muito bem para muita gente. Se não houvesse doença na terra, o inferno estaria muitíssimo mais cheio do que está. Não é muito não, é muitíssimo mais cheio do que está. Portanto, não é qualquer doença que Nossa Senhora cura.
Mas quando é o caso de curar, Ela cura com amor materno, gosta muito de curar. Mas Ela cura para que? Para fazer sentir às pessoas a bondade dEla. E para lhes estimular o desejo de se curarem dos males, das doenças da alma, para adquirirem os bens da alma; é para isso que Ela faz. E é assim que a coisa deve ser vista. Realmente para a cura do corpo, considerando também em si a cura do corpo, mas visando sobretudo a cura da alma.
Essas são as considerações que na novena de Nossa Senhora de Lourdes eu podia fazer.


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O Que pedir a Nossa Senhora de Lourdes

Extratos do "Santo do Dia" de 10 de fevereiro de 1965
(...) Como Nossa Senhora de Lourdes quis ser conhecida enquanto sumamente benfazeja, eu sugiro aqui - mas evidente que é uma mera sugestão que só deve seguir se se tem apetência - que se faça o seguinte: pensar de véspera numa grande graça para pedir a Nossa Senhora. Nas nossas orações nós devemos ser ousados.
Nós devemos pedir coisas arrojadas, não porém insensatas. É uma coisa profundamente diferente. Mas coisas sensatas e difíceis devemos pedir e, ao mesmo tempo, devemos pedir a Nossa Senhora com muita insistência. Quem sabe se cada um de nós estuda uma graça que queira, uma graça espiritual e uma graça temporal para o dia de amanhã. Uma graça que diga respeito à santificação e depois alguma coisa que queiramos de temporal e que peçamos que Nossa Senhora nos dê, se for para o bem de nossa alma.
Isso nos leva a refletir um pouco em nossa vida. Leva-nos a levantar um pouco o panorama de nossa vida espiritual; leva-nos, por essa forma, a ter uma visão de nós mesmos e de nossas atividades, de nossos rumos, mais precisa; e leva-nos a fazer uma oração grata a Nossa Senhora. De maneira que eu sugiro que se faça isso.
Eu gostaria de dizer uma outra coisa (eu volto a dizer, é um puro conselho, mas enfim é uma informação interessante): na Igreja do Sagrado Coração de Jesus [na cidade de São Paulo] há uma gruta com uma imagem de Nossa Senhora de Lourdes. Essa não é uma imagem qualquer, como se encontram, aliás veneráveis, em várias outras igrejas. Mas essa imagem, segundo o documento que está lá, se não me engano, era a imagem que era venerada na gruta de Lourdes antes de estar a imagem atual. E foi portanto objeto de veneração lá e constitui um elo com Lourdes, um elo mais direto entre Lourdes e nós.
Por causa disso, a horas tantas da tarde - eu não me lembro mais qual é a hora, mas os jornais costumam dar na seção religiosa - há uma bênção dos doentes, e há uma ou outra pessoa até que se tem dito curada lá. Não se tem feito investigações mas até isto há.
Mas nós nunca devemos nos esquecer que as doenças do corpo, no Evangelho, são tratadas como sendo símbolos das doenças da alma. E que assim como alguns sofrem de paralisia do corpo, outros sofrem de paralisia da alma; uns sofrem de cegueira do corpo, outros da alma; surdez, mudez e outras coisas. Se nós temos defeitos da alma que nós gostaríamos de corrigir, seria o momento adequado para nós os levarmos lá aos pés dEla e pedirmos a Ela que nos cure. É um pedido que tem muita razão de ser, porque se Nossa Senhora quer tanto curar corpos perecíveis, mortais, quanto mais ela quererá curar almas imperecíveis e imortais. Nosso Senhor Jesus Cristo não veio à terra para salvar corpos, Ele veio à terra para salvar almas, e por isso nossos pedidos não podem deixar de ser muito gratos a Ela. Por nós ou por alguém por quem nós nos interessamos, por alguém por quem nós façamos apostolado; por uma alma cujas dificuldades nos amedrontam; por um amigo cujas aflições, ou cujas tentações, e cujos perigos, constituem para nós uma fonte de preocupação.
Irmos lá e fazermos esse pedido nessa hora ou na hora da Missa, na hora da bênção do Santíssimo Sacramento, por exemplo. Esta é, portanto, a sugestão que eu gostaria de dar.


Fonte:
http://www.pliniocorreadeoliveira.info/DIS_SD_650204_Lourdes_e_a_Mediacao_Universal.htm

quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Sou a Rainha das Vitórias e a
Mãe do Bom Sucesso

Carlos Antonio E. Hofmeister Poli
Coronel do Exército de Cavalaria e Estado-Maior (R)

Há 402 anos Nossa Senhora apareceu a uma religiosa espanhola no mosteiro das concepcionistas em Quito (Equador), e ordenou que se confeccionasse uma imagem sua sob as invocações do título, profetizou impressionantes acontecimentos para os séculos futuros, inclusive o nosso.
Nossa Senhora apareceu em 2 de fevereiro de 1610 a Madre Mariana de Jesus Torres, espanhola da alta nobreza, uma das oito fundadoras do mosteiro das concepcionistas de Quito, para ordenar-lhe a confecção de uma imagem a Ela dedicada. Estamos, portanto, no ano do IV centenário dessa aparição.
A milagrosa imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso venera-se no Monasterio Real de La Limpia Concepción, em Quito, primeiro convento de monjas contemplativas da América do Sul, fundado em 1577 sob os auspícios do rei de Espanha Filipe II.
Neste artigo serão apresentadas as importantes relações que a devocão a essa imagem tem com os dias atuais. No quadro abaixo, a apreciação de Plinio Corrêa de Oliveira sobre Ela, a ordem do universo e a civilização cristã.

Histórico das aparições
Situemo-nos no ano de 1556. Matronas da cidade de Quito, devotas de Maria Imaculada (o dogma só viria a ser proclamado em 1854), desejosas de ter em sua cidade um mosteiro de religiosas concepcionistas, pediram a Filipe II a fundação naquela colônia de um mosteiro consagrado à Imaculada Conceição. O rei enviou, para atender a tão excelente pedido, um grupo de religiosas fundadoras, tendo à testa a Rvda. Madre Maria de Jesus Talvada, descendente de nobre e antiga casa da Galícia, e também a sobrinha desta, a cândida menina Mariana.
A par de sua candura, era Mariana notável por sua rara formosura de alma e de corpo. Grande devota do Santíssimo Sacramento, dotada do dom da profecia, conheceu as inumeráveis dificuldades e sofrimentos pelos quais passariam as religiosas; e, uma vez fundado o mosteiro, o ódio e as perseguições do demônio contra a comunidade ao longo dos séculos. Teve ainda conhecimento de que o mosteiro duraria até o fim do mundo, e que nele haveria sempre uma alma santa, em todos os tempos. Foi-lhe também revelado que a Rainha dos Céus comunicar-se-ia com ela por meio de aparições.
A 13 de janeiro de 1577, fundava-se o mosteiro. Mariana não pôde professar na ocasião, por ter apenas 13 anos. Iniciou seu noviciado e professou aos 15, com o nome de Mariana de Jesus.
A vida de Madre Mariana de Jesus Torres é um portento de santidade. Mantinha profunda intimidade com seu anjo da guarda, e sua devoção dominante era a Jesus Sacramentado. Êxtases, visões e revelações alternavam-se com terríveis perseguições, não só do demônio como também de religiosas relapsas.
Certo dia ocorreu com suas irmãs de hábito algo muito grave. Madre Mariana sofreu em silêncio e recorreu a Nosso Senhor, comunicando-Lhe seus tormentos. O Divino Redentor apareceu-lhe e disse:
— Quando te desposei, experimentei com cuidado tua vontade.
— Senhor — respondeuMadre Mariana — minha vontade está pronta, mas a carne é fraca.
Ao que Nosso Senhor acrescentou:
Não te faltará fortaleza, assim como não falta nada à alma que Me pede.1
Nesse momento, viu ela Jesus Cristo no Gólgota, quando Ele começava a agonizar. Aterrorizada, exclamou: “Senhor, sou eu a culpada, castiga-me e poupa teu povo!”. Apareceu-lhe então a Santíssima Virgem, que lhe disse:“Não és tu a culpada, mas o mundo criminoso. Estes castigos são para o séc. XX”. Viu então três espadas, cada uma com uma legenda: Castigarei a heresia; Castigarei a blasfêmia; Castigarei a impureza.2
A Santíssima Virgem prosseguiu: “Queres, minha filha, sacrificar-te por este povo?”. Madre Mariana respondeu: “Minha vontade está pronta”. As espadas cravaram-se em seu coração, e ela caiu morta pela violência da dor.3 Morreu verdadeiramente Madre Mariana, e foi apresentada ao juízo de Deus: o Padre Eterno regozijou-se por tê-la criado; o Filho Divino, por tê-la redimido e tomado por esposa; e o Espírito Santo, por tê-la santificado.
Estava no Céu a alma de Madre Mariana, enquanto na Terra se elevavam orações fervorosas por sua vida. Nosso Senhor, querendo atender a essas súplicas, fez Madre Mariana ver como as orações por sua vida subiam ao trono de Deus. Apresentou-lhe duas coroas — uma de glória imortal, e a outra cercada de espinhos — enquanto lhe dizia: “Esposa minha, escolhe uma destas coroas”. E a fazia entender que, com a coroa de glória, ficaria no Céu, ao passo que com a outra voltaria a padecer no mundo. Madre Mariana pediu que a Divina Majestade escolhesse, e não ela. Nosso Senhor respondeu:“Não. Quando te tomei por esposa, provei tua vontade, e agora faço o mesmo”.4
Madre Mariana teve então conhecimento do futuro do mosteiro, das monjas que se salvariam e das que se condenariam; das imensas calamidades do séc. XX, durante o qual choveria fogo do Céu, consumindo os homens e purificando a Terra; das almas daquele mosteiro, as quais, por sua santidade, aplacariam a cólera divina. Voltou-se então para Nossa Senhora e pediu que Ela mesma governasse o mosteiro; e aceitou retornar à Terra, tendo então escolhido, humilde e resignada, a coroa de espinhos. Regressava à vida, com seus 20 anos de idade.

Origem da milagrosa imagem

A vida de Madre Mariana de Jesus Torres, a quem Nossa Senhora do Bom Sucesso apareceu, foi escrita com admirável unção por Frei Manoel de Sousa Peraira, na segunda metade do séc. XVIII, baseando-se no Cuadernón,5 que ele pôde consultar. Este Cuadernón foi posteriormente escondido, em local e data desconhecidos, a fim de preservá-lo das perseguições religiosas pelas quais viria a passar o Equador nos séculos XIX e XX. No livro A Vida Admirável da Rvda. Madre Mariana de Jesus Torres”, de 264 páginas, no qual se baseiam estas linhas, Frei Manoel relata pormenorizadamente as três mortes e duas ressurreições de Madre Mariana, sua atuação como religiosa modelar, seus sofrimentos e lutas, os estigmas de Nosso Senhor Jesus Cristo (os quais ela recebeu aos 25 anos) e outros fatos extraordinários de sua admirável vida mística. Seu corpo incorrupto, que assim se conserva desde sua derradeira morte em 16 de janeiro de 1635, em capela de seu mosteiro, confirma alguns desses fatos.
Neste artigo, limitar-nos-emos a abordar mais extensamente a aparição de Nossa Senhora para lhe ordenar a confecção de sua imagem, e como esta foi realizada; ocupar-nos-emos também das revelações que Madre Mariana recebeu da Santíssima Virgem, com referência particular aos dias em que vivemos.
No ano de 1610, rezava insistentemente Madre Mariana à primeira hora da madrugada, prostrada ao solo no coro, pelas necessidades de seu mosteiro, da colônia espanhola da América e da Igreja, quando notou a presença de uma Senhora de extraordinária formosura, sustentando no braço esquerdo um Menino belo como a aurora. Emocionada, a religiosa perguntou:
— Quem sois, linda Senhora, e que desejais de mim, que sou só uma sofrida monja?
— Sou Maria do Bom Sucesso, a Rainha dos Céus e da Terra. Porque me invocaste com terno afeto, venho do Céu consolar teu aflito coração. Tuas orações, lágrimas e penitências são muito agradáveis a nosso Pai Celestial. Na mão direita, tenho o báculo que vês, pois quero governar este meu mosteiro como Priora e Mãe. Satanás quer destruir esta obra de Deus, mas não o conseguirá, porque Eu sou a Rainha das Vitórias e a Mãe do Bom Sucesso, sob cuja invocação quero fazer prodígios em todos os séculos.
É vontade de meu Filho Santíssimo que mandes confeccionar uma imagem, tal como me vês, e que a coloques no trono da abadessa. Na minha mão direita porás o báculo e as chaves da clausura, em sinal de minha propriedade e autoridade. Em minha mão esquerda porás meu Divino Filho. Eu mesma governarei este meu Mosteiro.6
— Senhora —ponderou a religiosa — como realizar tudo isso, se até desconheço Vossa estatura?
— Dá-me o cordão franciscano que trazes à cintura.
A Santíssima Virgem o tomou e colocou uma de suas extremidades na mão de seu Divino Filho, que o aplicou à cabeça da Mãe, indicando a Madre Mariana que, com a outra ponta, tocasse seus pés. O cordão milagrosamente se esticou, até alcançar a estatura exata da Santíssima Virgem.
— Aqui tens, minha filha, a medida de tua Mãe do Céu. Meu servo Francisco del Castilho, a quem explicarás minhas feições e minha postura, talhará minha imagem, pois tem reta consciência e observa religiosamente os mandamentos de Deus e da Igreja. De tua parte, ajuda-o com orações e humildes sofrimentos”.7

Francisco del Castillo preparou-se com penitências, para tão alto encargo: confessou-se, comungou, e no dia 15 de setembro de 1610 iniciou a confecção da imagem. Quando faltavam apenas os retoques finais, certo de que a imagem, embora satisfatória, nem de longe representava o que Madre Mariana havia visto, resolveu não só fazer mais penitência, mas saiu de viagem em busca das melhores tintas para concluir o trabalho. De regresso, surpreendeu-se ao encontrar já concluída a imagem. Diante do bispo, fez juramento escrito para testemunhar que a imagem não era obra sua, e que a havia encontrado, ao voltar, com uma forma muito diferente da que havia deixado, seis dias antes.
Madre Mariana de Jesus descreve assim os acontecimentos: rezava às três horas da madrugada do dia 16 de janeiro de 1611, no coro, onde estava a imagem que ia sendo esculpida por Francisco del Castillo, quando viu os arcanjos São Miguel, São Gabriel e São Rafael, os quais se apresentavam diante do trono da Rainha dos Céus. São Miguel, saudando-a, disse: “Ave Maria, Filha de Deus Padre”; São Gabriel acrescentou: “Ave Maria, Mãe de Deus Filho”; e São Rafael concluiu: “Maria Santíssima, Esposa puríssima do Espírito Santo”. Nesse momento apareceu São Francisco de Assis, e se uniu aos três arcanjos. Seguidos da milícia celeste, acercaram-se da imagem semi-acabada, transformando-a e refazendo-a, dando-lhe uma beleza inigualável que mão humana jamais poderia conferir. A Virgem estava totalmente iluminada, como se estivesse no meio do sol. Do alto, a Santíssima Trindade olhava comprazida o que acontecia, e os anjos entoavam suas melodias. No meio de todas essas alegrias, a Rainha do Céu penetrou pessoalmente na imagem, como raios de sol que se introduzem em um cristal. Como que tomando vida, tornou-se resplandecente, e com celestial melodia cantou o Magnificat. Os anjos entoaram o hino Salve Sancta Parens (Ave, ó Santa Progenitora).
Essa foi a origem da milagrosa imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso.8
As extraordinárias revelações da Virgem Santíssima

Madre Mariana recebeu grande número de revelações, nas quais Nossa Senhora profetizou acontecimentos do século XX e vários que já se realizaram. Convido o leitor a tomar conhecimento de alguns, dentre muitos.
Talvez para algum leitor, habituado às precisões matemáticas de hoje (aliás, de si elogiáveis), seja útil mostrar antes a conexão entre o que Nossa Senhora diz sobre o século XX e o que se passa em 2010. Com efeito, cada século se define mais pelo desenrolar dos acontecimentos relevantes que nele se verificam do que pelos dois zeros que caracterizam o ano como múltiplo de cem. Assim, os historiadores situam a Revolução Francesa como acontecimento do século XVIII, ao passo que ela se prolongou, com sua difusão por Napoleão Bonaparte, até o Congresso de Viena em 1815; e só consideram concluído o séc. XIX com o fim da Belle Époque e o início da I Guerra Mundial, em 1914. Isto porque a conceituação mais adequada de um século reside no significado profundo que ele tem na arquitetonia da História. Outro exemplo: quando Paulo VI9 e João Paulo II10 tratam, com clareza e precisão, da tragédia ocorrida na Santa Igreja depois do Concílio Vaticano II, referem-se evidentemente a um fenômeno do séc. XX, tragédia que se prolonga e se desdobra até nossos dias.
“Um presidente verdadeiramente católico”

Em aparição de 16 de janeiro de 1599, Nossa Senhora disse a Madre Mariana: “A pátria em que vives deixará de ser colônia e será república livre; então, chamar-se-á Equador e necessitará de almas heróicas para sustentar-se no meio de tantas calamidades, públicas e privadas”. Previsão cumprida 200 anos depois. Nessa mesma aparição, a Santíssima Virgem afirmou: “No séc. XIX haverá um presidente verdadeiramente católico, varão de caráter, a quem Deus dará a palma do martírio, na mesma praça onde está este meu convento. Ele consagrará a República ao Divino Coração de meu Filho Santíssimo, e esta consagração sustentará a Religião católica nos anos posteriores, os quais serão amargos para a Igreja”. Com efeito, em 25 de março de 1874, Gabriel Garcia Moreno [foto] tornou o Equador a primeira nação da América consagrada ao Sagrado Coração de Jesus. E no ano seguinte, a 6 de agosto, entregou sua alma a Deus, assassinado pelos inimigos da fé, na mesma praça em que está situado o mosteiro. Antes de expirar, escreveu no solo, com o próprio sangue: Dios no muere.11

“Quando tudo parecer perdido, será o início do triunfo da Santa Igreja”

Em aparição de 2 de fevereiro de 1634, Nossa Senhora do Bom Sucesso entregou o Menino Jesus a Madre Mariana. Em seus braços, Ele revelou-lhe a proclamação do Dogma da Imaculada Conceição, quando “meu Vigário” (o Papa) estiver cativo; e o dogma da Assunção, depois de o mundo sair de um banho de sangue. O que se verificou, respectivamente, em 1854, no pontificado do Bem-aventurado Pio IX, e após a II Guerra Mundial, em 1950.
Em 8 de dezembro de 1634, a Rainha do Céu e da Terra indicou a Madre Mariana que sua invocação de Bom Sucesso iria ser a sustentação e guarda da fé, face à total corrupção do séc. XX. Ela predisse que, “nesses tempos de calamidade, quase não haverá inocência infantil [...], a atmosfera estará saturada de impureza, a qual, como um mar imundo, correrá pelas ruas, praças e lugares públicos com uma liberdade assombrosa, de maneira que quase não se encontrarão no mundo almas virgens[...]. Quanta dor sinto ao te manifestar que haverá muitos e enormes sacrilégios públicos e também ocultos, profanações da Sagrada Eucaristia. [...] Meu Filho Santíssimo será lançado ao solo e pisoteado por pés imundos. [...] O Sacramento da ordem sacerdotal será ridicularizado, oprimido e desprezado, porque nesse sacramento se oprime e denigre a Igreja de Deus e a Deus mesmo, representado em seus sacerdotes. [...] O Sacramento do matrimônio, que simboliza a união de Cristo com a Igreja, será atacado e profanado em toda a extensão da palavra [...]. Impor-se-ão leis iníquas, com o objetivo de o extinguir, facilitando a todos viverem mal”.12
Dramaticamente essas profecias indicam o que ocorre em nossos dias em relação aos sacrilégios, ao sacerdócio e àquilo que seria então inacreditável: a legalização de uniões de indivíduos do mesmo sexo, como se elas fossem casamento.
E Nossa Senhora do Bom Sucesso acrescentou: “Quando tudo parecer perdido, será o início do triunfo da Santa Igreja. O pequeno número de almas que guardarão o tesouro da fé e das virtudes sofrerá um cruel e indizível padecer, a par de um prolongado martírio [...], haverá uma guerra formidável e espantosa, na qual correrá sangue de nacionais e estrangeiros, de sacerdotes e de religiosas. Essa noite será terrível, pois parecerá ao homem o triunfo da maldade. Será chegada, então, a hora em que Eu de maneira assombrosa destronarei o soberbo e maldito Satanás, pondo-o abaixo de meus pés e sepultando-o no abismo infernal. Deixarei por fim livres, a Igreja e a pátria, de sua cruel tirania [...]. Ora com insistência, pedindo a nosso Pai Celeste que se compadeça e ponha termo, o quanto antes, a tempos tão nefastos, enviando à Santa Igreja o prelado (do latim, “praelatus” — aquele que vai à frente),que deverá restaurar o espírito de seus sacerdotes. A esse filho meu muito querido amamos, meu Filho Santíssimo e Eu, com amor de predileção, pois o dotaremos de uma capacidade rara, de humildade de coração, de docilidade às divinas inspirações, de fortaleza para defender os direitos da Igreja e de um coração terno e compassivo, para que, qual outro Cristo, atenda o grande e o pequeno, sem desprezar o mais desafortunado que lhe peça luz e conselho em suas dúvidas e amarguras [...]. Em sua mão será posta a balança do Santuário, para que tudo se faça com peso e medida, e Deus seja glorificado”.13

“Alegre e triunfante, qual terna menina, ressurgirá a Igreja”

Em outra ocasião, revelando a mesma situação com ênfase diferente, Nossa Senhora do Bom Sucesso diz: “Tempos funestos sobrevirão, nos quais, cegando na própria claridade, aqueles que queriam defender em justiça os direitos da Igreja, lsem temor servil nem respeito humano, darão a mão aos inimigos da Igreja, para fazer o que estes quiserem. Mas ai do erro do sábio — o que governa a Igreja —, do Pastor do redil que meu Filho Santíssimo confiou a seus cuidados. Mas quando aparecerem triunfantes e quando a autoridade abusar de seu poder, cometendo injustiças e oprimindo os débeis, próxima está sua ruína. Cairão por terra estatelados. E, alegre e triunfante, qual terna menina, ressurgirá a Igreja e adormecerá brandamente, embalada em mãos do hábil coração maternal de meu filho eleito e muito querido daqueles tempos, ao qual, se dócil prestar ouvido às inspirações da graça — sendo uma delas a leitura das grandes misericórdias que meu Filho Santíssimo e Eu temos usado contigo —, enchê-lo-emos de graças e dons muito particulares, fá-lo-emos grande na Terra e muito maior no Céu, onde lhe temos reservado um assento muito precioso, porque, sem temor dos homens, combateu pela verdade e defendeu, impertérrito, os direitos de sua Igreja, pelo que bem o poderão chamar mártir”.14
As profecias de Nossa Senhora à Madre Mariana de Jesus Torres impressionam, quer pela clareza com que predisse acontecimentos já realizados, quer pela exatidão com que descreve a imensa crise de nossos dias. E são inteiramente afins com as mensagens de Nossa Senhora em Fátima e em La Salette.
Considerações finais

Deus colocou no centro, e como razão de ser de toda a criação, a realeza de Nosso Senhor, e juntamente a de Nossa Senhora. Assim o esclarece a concepcionista Madre Maria de Ágreda em sua célebre obra Cidade Mística de Deus: “Em Cristo e em Maria estiveram previstas todas as demais obras, e por causa deles, de acordo com o nosso modo de falar, o Altíssimo sentiu-se mais empenhado a criar o restante das criaturas”.15Confirmando esta tese, basta o leitor considerar que Nosso Senhor Jesus Cristo é Deus verdadeiro e verdadeiro Homem; é uma só Pessoa, com as naturezas humana e divina; e Nossa Senhora, mera criatura, é Mãe de Deus. À luz da fé, portanto, não se podem conceber píncaros mais altos que o do Homem-Deus e o de sua Mãe Santíssima. Píncaros estes para os quais converge necessariamente toda a criação, que encontra neles seu centro e sua razão de ser.
Plinio Corrêa de Oliveira relacionava a imagem de Nossa Senhora do Bom Sucesso com a idéia que tinha de Nossa Senhora no Céu. Via ele nessa imagem algo que o remetia ao cume da ordem do universo: majestade, misericórdia, poder, beleza, justiça, bondade, pureza e superioridade incomparáveis, só transcendidas, de modo infinito, por Deus. Disto se tem melhor idéia considerando-se que, conforme explicitou Dr. Plinio, a ordem católica — a civilização cristã — é “austera e hierárquica, fundamentalmente sacral, anti-igualitária e antiliberal”.16
Austera, porque exige o cumprimento dos dez Mandamentos da Lei de Deus, como condição de perfeição.
Hierárquica, porque tudo quanto existe é desigual: Deus, infinitamente superior e supremo Legislador; e as criaturas — anjos, homens e seres irracionais — todas insondavelmente desiguais entre si.
Essas desigualdades criadas por Deus não são aterradoras e monstruosas, mas sim proporcionadas à natureza, ao bem estar, ao progresso de cada ser e adequadas à ordenação geral do universo, na qual o mais alto é, a um ou outro título, causa, modelo e mestre do inferior.17 Nessa escala hierárquica, tudo se reporta a Deus, infinitamente nobre, sublime e elevado. Nisto está o âmago da religiosidade.
Se assim é a ordem do universo — hierárquica, harmônica e austera — é compreensível que a humildade inclina ao amor às superioridades; portanto, à autoridade e à obediência. E o orgulho conduz ao ódio a toda desigualdade e à revolta contra toda lei, divina ou humana. Tal ódio, igualitário e subversivo, é o fator mais dinâmico da imensa crise moral que assola o mundo atual. Crise igualitária de revolta e permissivismo moral desenfreado.
Em Nossa Senhora do Bom Sucesso coexistem harmonicamente a representação tanto da suprema majestade quanto da bondade materna criadas, e de uma virginalidade e castidade inigualáveis — daí ser essa devoção particularmente indicada contra o espírito revolucionário de nossos dias. Espírito neopagão, de índole comunista, socialista e anárquica, característica esta que se patenteou na revolução da Sorbonne, de maio de 1968.
Sobre tudo isso paira a realeza de Nossa Senhora, presente em qualquer de suas invocações, pois Ela é sempre Rainha. Em Nossa Senhora das Dores, por exemplo, pois só uma rainha sofre daquela forma e com tamanha intensidade. A nota dominante dessa invocação, porém, convida à compaixão e à compunção. Nossa Senhora do Bom Sucesso apresenta-se-nos como rainha em toda sua grandeza. Como toda rainha, também é mãe, com toda sua maternalidade e ternura.
Conforme o pensamento de Dr. Plinio, toda mulher é rainha, na medida em que é mãe e esposa. Se isto é verdadeiro, por mais modesto que seja o lar, como será então quando se trata da Rainha do Céu e da Terra!
* * *
Para concluir, nada poderia ser mais eloqüente do que valermo-nos das palavras da própria Senhora do Bom Sucesso, dirigidas à Madre Mariana de Jesus Torres: “Eu sou poderosa para aplacar a Justiça Divina e alcançar piedade e perdão para toda alma pecadora que a mim recorra com coração contrito, porque sou a Mãe de Misericórdia, e há em mim bondade e amor”.18